Não creio em diabo. Creio em Deus. Deus é tudo. O diabo é o nada. O diabo é o não-Deus. Deus é em tudo. É Onipresente. O diabo é o ausente. É o não lugar, o vagar errante pelo mundo estando em tudo sem em nada morar.
O diabo não tem alma. É alma penada, anonadada, finada, extinta, acabada, aniquilada. O diabo é pelo que não é. Ele só existe pelo não existir. Se passa a ser, deixa de ser quem é. O diabo é morte, é destruição, é aniquilação, é mentira, é negação. É o humano quando toma o lugar de Deus e não deixa Deus ser Deus. Não que Deus não possa. O fato é que Deus não obriga, não impõem, não força. Deus oferece, faz proposta, espera resposta.
Deus é o Pão da Vida. Deus é a mesa cheia, farta, disposta e por todos composta. O diabo é a fome da morte. O diabo é a barriga vazia, roncando, gritando, fria. A fome é a antessala do diabo. Jesus a experimentou no deserto. Quarenta dias de barriga vazia. E veio a tentação. A fome nutre a tentação. Se és Deu transforma estas pedras em pão. O diabo provoca. A fome sufoca. Faz perder a razão.
A fome é o diabo que come o homem. É o pobre diabo catando comida na lata de lixo. É o humano transformado em bicho. Bicho-homem com fome. Bicho-homem sem nome. Bicho homem que come o que sobra da mesa dos homens que comem.
O diabo é aquele que come sem se importar com os que têm fome. O diabo é o grão que deixa de ser pão para ser commodity. É a carne vendida no mercado sem se importar com os ossos desnudos e a pele seca dos que moram ao lado. É a carne nova da mulher jovem e pobre exposta, desfrutada, vendida. O diabo é o país do agro com o povo morrendo de fome, morrendo de magro.
O estômago vazio é razão para qualquer ação. O que não faz um pai diante de um filho com fome? O que não faz uma mãe com o peito seco e a criança a chorar? O que não faz um filho diante do pai e da mãe a morrer por não ter o que comer? Diante da morte como única sorte, não há mais nada a temer. Roubar, assaltar, matar, prostituir. Deixar de ser parar sobreviver. É o ser do não-ser. É o perecer.
O homem não vive somente de pão. Tem que ter pão, sim. Temperado com sonho, carinho, emoção. Sem pão, tudo é não, é triste, é malsão. Para curar a fome de pão-que-é-não, é preciso a Palavra e a ação. Partir o pão. Repartir o pão. Comprometer-se com a ação. Dai-lhes vós mesmos o pão. Não o que sobra. Mas o que temos em nossa mão. Para o que está ao nosso lado. Pão para a multidão. Pão da amizade de uma nova sociedade onde não falte o pão. O pão é caridade, é fraternidade, é uma nova humanidade, é divindade. Deus é pão, é irmã, é irmão, é coração, é carne, é coração. Estende tua mão e dá de teu pão.