O pior cego não é aquele que não vê. Também não é aquele que não quer ver. O pior cego é aquele que não quer que os outros vejam o que ele vê. Sim! Essa é a conclusão do longo diálogo entre Jesus e os fariseus no episódio do Evangelho de João do Quarto Domingo de Quaresma.
Jesus cura um cego e os fariseus, questionados em seu senhorio religioso, querem convencer o curado e seus familiares de que o fato de o rapaz agora enxergar é algo pecaminoso diante de Deus. Os fariseus não se importam com a mudança radical na vida daquela pessoa que passou da cegueira à visão perfeita e das consequências positivas que isso tem na vida de seus familiares.
A preocupação dos senhores da lei é deslegitimar a ação de Jesus que colocava em crise seu domínio religioso sobre a comunidade judaica. Para isso, eles tentam ocultar a verdade que salta aos olhos: Jesus curou o cego! E se a vida do jovem mudou para melhor, é obra de Deus. Essa é a lógica da tradição judaica. Quem quer a cegueira é o diabo e seus sequazes. Se fosse obra do diabo, o jovem continuaria dependendo em tudo de seus pais.
Tão óbvio que somos tentados a pensar que isso é coisa de um passado remoto. Ledo engano! A situação é muito mais atual do que imaginamos. Talvez nunca antes na história da humanidade houve tantos videntes tentando impedir os cegos de verem. Talvez nunca antes a mentira foi utilizada tão amplamente como estratégia política para criar cegos e convencê-los de que a melhor condição par eles é a de não ver o que na verdade acontece ao seu redor.
Apenas a título de exemplo, um ex-presidente norte-americano dizia que ele não mentia, mas que apenas apresentava uma “verdade alternativa”. Um ex-presidente brasileiro, emulando seu tutor do norte, afirmava que nunca mentia, mas que apenas dizia uma verdade que os outros não reconheciam como tal. E os dois fizeram multidões se negarem a tomar vacinais e a devorar cloroquina e primaquina para combater a Covid-19. E o pior da história é que milhões de pessoas os seguiram e milhares morreram por se negarem a aceitar o que a ciência indicava e insistirem com os tratamentos inócuos recomendados pelos cegos que sabiam que não estavam vendo e queriam manter seus seguidores na escuridão para que não se dessem conta do precipício para o qual estavam sendo conduzidos.
Não querer ver é um modo terrível de conviver com a cegueira. Até aceitável em certos casos. Mas não recomendável como regra geral. Não querer que os outros vejam é uma opção satânica diante da cegueira de outrem. A primeira pode se dar por ignorância ou por acomodação. A segunda, por maldade ou ganância. Para a primeira pode haver perdão. Para a segunda, o fogo do inferno é a única solução.